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27/03/2009

Um caso... partiu se o vaso!



A sombra silenciosa dos conventos e mosteiros inculcada numa minuciosa organização horária. Ah, distraíram se, mas Lutero e Calvino apontaram o caminho: substituir a oração pelo trabalho.
Um quadro regulado pelos relógios, os sinos são os símbolos do relógio religioso.
Há um pecado de ter “a coragem de enfrentar o tempo”?
Para contrariar o apodrecimento interno, a apetência pateta pela esterilidade, a abulia vertiginosa e a promoção do insignificante não há fundo nem limites.
Afinal é possível retirar um orgulho da actividade despojada. Seres que desenvolvem a exorbitante força de inércia, honram a letargia e a preguiça em valores absolutos.
A partir dos nove fora nada, cada um dedica se à tarefa essencial e fútil: matar o tempo.
Estes partidários lunáticos da demissão , ancoram se na meteorologia: a alma como uma substância atmosférica, cujas oscilações podem ser medidas e mudar. Um desígnio meteorológico no relacionamento com os nossos humores. Sabe-se da influência dos climas sobre os regimes políticos.
O Universo sisudo perdeu a sua aspereza, está reduzido a superfície plana, a formas, a imagens. Pode se experimentar tudo na condição que nada seja importante.
A doença como uma forma de vida.
Mártires da banalidade … mas mártires.

18/03/2009

Crítica à legislação sobre Património



Pegue-se num princípio orientador, num quadro normativo, ou da suposta sensibilização pública do património arqueológico ou mesmo nas entidades com atribuições policiais e de vigilância para se chegar rapidamente à conclusão que as intenções estão imbuídas dum conveniente espectro ambíguo. Não se trata de analisar o conteúdo gramatical e semântico, pois por aí está tudo devidamente arrumado e enquadrado, mas sim de analisar uma lei na sua intenção e aplicabilidade em termos práticos reflectidos no quotidiano das nossas vidas. A restrição das hipóteses de uma lei criar campos dúbios, seria a primeira qualidade da lei a observar.
Principio orientador:
Decreto Legislativo Regional n.º 27/2004/A de 24 de Agosto.
a ameaça ao património arqueológico de destruição, em consequência da multiplicação dos grandes planos de ordenamento ou de escavações clandestinas, desprovidas de carácter científico…


A suposta intenção (governativa) de ordenar as coisas e as ideias, parte a priori em erro, e abre caminho à dualidade de critérios ou pareceres jurídicos, erro ao falar de escavações clandestinas e que por tal desprovidas de carácter científico, subentende-se que o científico é só aquele que praticado pelo governo ou que seja por ele indicado.
É perfeitamente possível e realizável que uma acção clandestina possa ter os ingredientes científicos, assim como o contrário, o de que uma acção ou intenção governativa (por imanar dele) seja científica por si só, também não tem sustentabilidade.
“ A ideia de progresso contingente exclui tanto a explicação, que transforma a descrição em dedução, como o arbítrio, que se apropria da contingência para afirmar de modo monótono que nada teve lugar, que os significados construídos e os problemas gerados se equivalem todos, pois são todos relativos ao seu contexto.”1
“ Uma ciência o mais objectiva possível, quer seja natural ou social, será a que inclui um exame consciente e crítico da relação entre a experiência social dos seus criadores e os tipos de estrutura cognitivas privilegiadas no seu modo de proceder.2


Artº. 1º
O quadro normativo relativo à gestão do património arqueológico, no sentido da prevenção, salvamento e investigação do património arqueológico imóvel e móvel na Região Autónoma dos Açores.


Lixeira a céu aberto da Ilha do Corvo.
A politica ambiental do Governo Regional na Ilha do Corvo que (e aqui o caricato) com o seu Parque Natural e a prestigiada Reserva da Biosfera da UNESCO atestam da dualidade lá atrás referenciada.
Um Centro de Interpretação Ambiental construído e inaugurado “ que está fechado e nunca funcionou”. Um Partido da Oposição critica este caso. (in Jornal Açoriano Oriental de 14-03-2009).


Artº. 3º
Compete à direcção regional competente em matéria de cultura a realização e colaboração em projectos e acções vocacionados para a sensibilização pública do património arqueológico, estimulando a sociedade civil para a promoção de iniciativas destinadas ao seu conhecimento.

Sabemos da aptidão inata que nós seres humanos temos para a saga da legislação, reforçada pela longa experiência que levamos na montagem de leis e normas ao longo da nossa história e que acabamos sempre por deixar o livre arbítrio com o rabo de fora.
Uma lei ou ordem posta numa folha de papel não passarão de palavras aceites pacificamente pelo próprio papel e será inócua se deixar o labiríntico da ambivalência ser o elemento regulador.


Artº. 34º.
Fiscalização
O cumprimento das disposições do presente diploma compete ao departamento do Governo Regional competente em matéria de cultura e ás entidades com atribuições policiais e de vigilância e fiscalização marítima.


Mesmo as “Acreditações” ,“Certificações” , são feitas pelo Estado global uno e omni.
Ele elabora e promulga a lei, corrige-a, sanciona e atribui a quem de direito. Compreende-se assim o “estado de graça” que daí advém e o grau de impunidade que podem gerar estas situações, ficando a via aberta para a aberração que amiúde verificamos nalgumas das realizações deste mesmo Estado, quando executa a sua protecção/preservação sobre o nosso património.
Atente-se no caso da fajã do calhau em São Miguel onde entra pelos olhos a dentro o atentório a uma situação de preservação da natureza, mas que e por estar de acordo com a legislação, “dentro do corpo da lei” se torna legitima, logo facto consumado.


Decreto Legislativo Regional nº. 28/2004/A
Fomento da empregabilidade e qualificação dos TRABALHADORES E PROMOÇÃO DO EMPREGO.


Esta intenção da promoção de emprego pode na verdade ter uma qualidade social subjacente , louvável até, mas em termos do móbil da preservação patrimonial e da memória colectiva passa-lhe ao lado.
É que depois e na prática quando um Museu é inaugurado porque se criaram um ou vários postos de trabalho e se quando qualquer um destes elementos falha o Museu acaba por estar fechado , negando assim a sua finalidade. Temos postos de trabalho mas não temos Museu.


Como solução um outro princípio orientador.
Defina-se então o que representa o paradigma: determinar as perguntas legítimas e os critérios segundo os quais se reconhece as respostas aceitáveis, impossibilitando uma terceira posição “fora do paradigma”.
Se o determinismo é o método que ao elaborar um conceito se consegue atingir o fim a que nos propomos, e aqui o que interessa é atingir o objectivo, façamo-lo sem rodeios e sem os complexos dos actos que nos levam a admitir que tudo o que decidamos terá que ter sempre o caminho da ambivalência. Sim, uma ditatorial norma que determine única e exclusivamente o resultado que se pretende, não é anti nada, pois na sua essência ela é pró qualquer coisa. Trata-se de uma escolha clara e inequívoca: ou quero atingir realmente o objectivo ( embora apelidado de anti qualquer coisa) ou prefiro ficar com o problema por solucionar, mas apelidado de democrático, tolerante, abrangente etc. Como exemplo cito a lei do código da estrada que determina que as viaturas devem circular pela direita ( em Portugal) e ao ser taxativa atinge resultados mais positivos. Imagine-se se a mesma lei fornecesse já no seu enunciado a dualidade de critério e que cada um decidia que conforme as circunstâncias ou os contextos poderia circular quer à esquerda direita ou centro, o caos e o acumular de processos jurídicos seria certamente o grande resultado.
Numa frase transformada em lei não interessa tanto a estética formal da mesma mas sim o que a sua estrutura enquanto enunciado ( lei) provoca e realiza na prática.


Da Fiscalidade e responsabilização.
Hoje em dia ,com os conhecimentos que temos dos servomecanismos, das mecânicas, dos modelos que se auto-regulam sem polícias ou fiscais, sendo os próprios elementos que compõem o modelo os reguladores por excelência, atente-se na engrenagem que realiza a existência de um relógio, em que o absoluto determinismo que lhe atribuímos, nos dá o resultado pretendido que são saber das horas.
Deixar ao critério humano a decisão de fiscalizar qualquer coisa, sabemos bem dos seus resultados. Atribua-se ao modelo (uma teoria mecanicista) a capacidade de se autoavaliar e de exercer uma eficaz fiscalização sobre si próprio enquanto modelo.
E se falamos de um património e uma memória colectiva que é de todos, tanto dos que estiveram , estão e estarão, não se pode deixar ao Estado a competência total. Assim este seria um assunto que deveria estar completamente independente da “alçada” do Estado, uma separação total entre eles. O que não constituiria novidade nenhuma, pois e só para dar o exemplo da Igreja, já houve uma altura em que foi decidida a separação do Estado e da Igreja e não advieram grandes males ao Mundo.
Forçosamente terá que existir um mecanismo que responsabilize. Assiste-se hoje em dia a uma desresponsabilização total dos actos e resultados ficando as más decisões sempre por atribuir. Se há benesses ou elogios nomeia-se a pessoa ou entidade visada. Se por acaso há uma crítica, ela já não é atribuída à pessoa ou entidade, mas sim à “conjuntura” que sabemos possuir as costas bem largas.



Bibliografia:
Legislação Regional sobre o Património
Legislação Nacional sobre o Património
Legislação Internacional sobre o Património
HARDING, Sandra, The Science Question in Feminism, Londres, ornell University Press, 1986.
STENGERS, Isabelle, As Políticas da Razão, Lisboa, Edições 70, 2000.
1 STENGERS, Isabelle, As Políticas da Razão, Lisboa, Edições 70, 2000.
2 HARDING, Sandra, The Science Question in Feminism, Londres, ornell University Press, 1986.

08/03/2009

Nkosi, o devorador de almas

Bruce Huffmann


havia naquele dia, um nauseabundo odor dos dentes cravados na carne jovem e inocente.
Nkosi assim fazia, por ser defeito. uma herança acontecera quando ele incinerara com as férreas garras, o alvo pescoço da inocência, enquanto dormia… um admirável horror mundo novo fora assim surgindo.
o lago mudo fora testemunha do vil estupro, um não-consensual, havia naquele dia nos olhos cor de arco íris de Koriskinha, uma resistência, ténue, porém, uma capa névoa de chumbeo peso, que ela sustentava nos olhos postos no ósseo chão de fileiras (in)humanas. o peso do arco temporal, uma trovoada seca anunciante de impiedades, uma combinação inoportuna, nos olhos de Nkosi a figura ferro/guerreiro.
havia naquele dia uma sabedoria em Koriskinha.
não olhar os olhos de Nkosi era sua armadura, se o começo involuntário queria evitar, que a loucura raízes e ramos já germinados a todos envolvia no mesmo plano solo, rumo apontado: o disforme. assim fazendo não tinha carne, não era corpo, distraída que estava ,seus olhos chorariam as cores nos leitos do barro estaladiço, a uma foz chegaria , mesmo que milénios dure a distância a percorrer.